13 Reasons Why – Porque assistir
Essa
é a história de Hannah Baker. Uma garota inteligente, bonita e
carismática que poderia ter um ótimo futuro pela frente. Mas não
teve. Ela tirou a própria vida. Sem deixar uma carta ou bilhete, mas
sete fitas K7 contendo os treze motivos que a levaram a esse fim.
Treze motivos que podem fazer você rever seus conceitos sobre muitas
coisas.
Isso
não é nenhum spoiler. Sem aquela de “será que ela vai mesmo
fazer isso?”, “será que alguém consegue impedi-la?”,
“será que a ambulância chega a tempo?”. Sabemos desde o
primeiro momento que Hannah cometeu suicídio, mas não sabemos como
nem porquê. No caso, porquês. Começamos a descobrir junto com
Clay, que ainda triste com a morte da amiga (por quem era apaixonado)
encontra uma caixa de sapatos na porta de sua casa quando volta da
escola. Nela estão as fitas e um mapa. E a cada episódio ouvimos
com Clay um lado de cada fita, a voz de Hannah relatando seus
motivos. Revivendo momentos críticos ao mesmo tempo em que
acompanhamos as consequências. De tudo.
O
fato é que Clay não é o único e nem o primeiro a ouvir as fitas,
pois elas vem com uma missão: Ouvir, ir aos locais mencionados e
passar para o próximo da lista. No caso, o próximo motivo. Caso
alguém não cumpra até o fim, um amigo a quem Hannah confiou cópias
das fitas deve divulgá-las. Num primeiro momento isso pode soar como
algum tipo de vingança, mas ela só queria que entendessem como seus
atos a afetaram, e refletissem a respeito antes de transformar tais
atos em hábitos. Infelizmente, nem todos recebem dessa forma.
A
cada gravação, a cada motivo, percebemos que pequenas ações têm
grandes consequências. (Ou, pelo menos, que parecem pequenas para
quem as faz.) Principalmente se quando somadas transformam-se numa
grande bola de neve destruidora de autoestima. E junto às ditas
“pequenas coisas” estão as grandes coisas, que já seriam
bastante avassaladoras para alguém que não estivesse passando por
maus momentos. Imagine para alguém passando por um estado de
depressão. Mas ainda hoje existe quem avalie depressão como
“drama”, e suicídio como coisa de quem quer aparecer. Até como
fraqueza ou egoísmo. Vemos essas opiniões ecoando por diversos
personagens em diferentes momentos. Mas a verdade é que você não
pode saber como algo afeta alguém a não ser que esteja disposto a
se abrir e se colocar no lugar daquela pessoa.
Causa
e efeito permeiam cada momento, cada cena e diálogo. Vemos o que
cada um fez e como reagiu ao saber que seu ato teve um peso tão
destruidor. Alguns admitem, até se arrependem. Outros não. De fato,
nem todos agiram por pura e simples maldade. Apenas foram incapazes
de avaliar previamente as consequências de seus atos. São pessoas
que também tem seus problemas e suas dores, sem saber como pedir
ajuda. Enquanto outros simplesmente consideraram um exagero da parte
de Hannah, alegando que ela passou pelas mesmas coisas que todas as
outras garotas do ensino médio. Todavia, todos passaram boa parte do
tempo dizendo que nem tudo era verdade, que Hannah mentiu. Mas a
verdade dói.
E se
os efeitos importam tanto quanto as causas, também precisamos saber
como o suicídio de Hannah afetou as pessoas ao seu redor. (Além das
mencionadas nas fitas.) Seus pais, os pais dos colegas, o pessoal da
escola. Seus pais se culpam, se perguntam como não foram capazes de
perceber os sinais. Os pais dos colegas se preocupam que seus filhos
estejam abalados e acabem fazendo o mesmo, mas jamais cogitam que
possam ser agentes causadores. A escola espalha cartazes antibullying
e de prevenção ao suicídio, mas é omissa quanto ao bullying que
já corria solto pelos corredores e às pichações grosseiras nos
banheiros. Os adultos esquecem que já foram jovens, e fecham os
olhos para o mal que seus filhos possam infligir ou sofrer. Nem
sempre por ausência ou negligência, mas por pensar que seus
descendentes são perfeitos.
A
série inspirada no livro Os 13 Porquês de Jay Asher (Editora
Ática, 2009) teve sua primeira temporada disponibilizada
mundialmente no Netflix em 31 de março deste ano, gerando
furor e polêmica. Honestamente, não é agradável de se assistir. É
intrigante, perspicaz, misteriosa, elucidativa, emocionante,
muitíssimo bem elaborada… Mas não é agradável. E nem deveria
ser. Por tratar de assuntos como bullying, uso de drogas, agressão,
abuso e violência sexual, depressão e suicídio com realismo muitas
cenas podem chocar mais do que você pode estar acostumado. Fazendo
com queira parar as cenas por um momento. Não é a toa que alguns
episódios são antecedidos por aviso de cenas fortes. Todavia, a
série deve ser assistida e seu conteúdo debatido.
13
Reasons Why não é a primeira a tratar de tabus que assolam a
sociedade usando um ambiente escolar. Mas se sobressai por não
tratar seu público como adolescentes ou jovens, mas como pessoas. Em
parte porque não é dirigido apenas a esse publico, mas a todos. Há
quem diga que quando uma obra aborda o tema do suicídio incentiva as
pessoas a cometê-lo, principalmente jovens por serem mais
suscetíveis. Inclusive, parte da polêmica veio pela série mostrar
em uma cena explicita o suicídio de Hannah. Entretanto, acredito no
oposto. O assunto deve ser discutido para que possamos combatê-lo.
Afinal, se contamos histórias e debatemos sobre coisas como
escravidão e holocausto para que nunca mais se repitam, ou sobre
preconceito e violência doméstica para que sejam combatidos, por
que seria diferente com o suicídio? Em uma carta aberta, o
roteirista Nic Sheff disse que tomaram a decisão de fazer a cena
para mostrar e realidade, de que não é um alívio. É doloroso e
sofrido.
De
qualquer forma, apegar-se apenas a essa cena - e ainda tirá-la de
contexto – é minimizar e até negar a mensagem da série como um
todo. Precisamos prestar mais atenção uns nos outros. Precisamos
entender que não só de guerras, pobreza, doenças e violência dos
grandes centros urbanos é feito o sofrimento humano. Que o que pra
você pode ser irrelevante, para outro pode significar muito. Que
“estabilidade social” não significa isenção de dor. Muitas
coisas podem fazer uma pessoa sofrer, mas precisamos estar dispostos
a ouvir. Pois nem sempre pessoas deixam de pedir ajuda por estarem
abandonadas ou negligenciadas. Elas podem estar cercadas por pessoas
que as amam e cuidam delas, mas não encontram oportunidade para se
abrir e se queixar até por uma sensação de que não tem esse
direito. Hannah não é a única personagem a demostrar isso; Jess,
Alex, Courtney e Zach refletem isso com outras perspectivas. Pense um
pouco, quando você pergunta como alguém está (mesmo alguém que
vive com você) está aberto a uma resposta negativa? Se sim, você
deixa isso transparecer? É isso que precisa ser trabalhado. Como diz
Clay em certo momento: “Tem que melhorar, a maneira que tratamos
uns aos outros e olhamos uns pelos outros, de alguma forma temos que
melhorar.”
Ainda
não tive oportunidade de ler o livro no qual a série se baseia, mas
pelo que me informei essa 1ª temporada acaba do mesmo modo que a
obra original. Embora não se tenha confirmação de uma 2ª
temporada, há muita torcida e especulação sobre ela. O próprio
Jay Asher diz gostar da ideia de uma continuação para seus
personagens. E Selena Gomez que foi produtora-executiva revelou que a
ideia é sim dar continuidade, por isso já foi concebida como série.
Existe sim muita coisa que ainda pode ser mostrada, muitos caminhos a
se explorar. De qualquer forma, já existe muita coisa que pode ser
esmiuçada e pensada. Não só sobre suicídio, mas sobre muitas
questões. Quem precisa de ajuda pode ser estimulado a pedir por ela,
e quem está por perto ficar mais aberto. Precisamos falar,
necessitamos ouvir.